Se São Paulo mantém o Bom Prato há 24 anos, por que o Brasil ainda não conseguiu criar uma política nacional de restaurantes populares?
O Bom Prato de São Paulo já provou que é possível oferecer refeições de qualidade a preço simbólico, de forma contínua, acolhedora e eficiente. O programa nasceu em 2000 e se manteve firme por 24 anos, mesmo em diferentes governos. Mas a pergunta que ecoa é inevitável: se funciona em São Paulo, por que o Brasil inteiro não tem uma rede semelhante?
O artigo 6º da Constituição Federal reconhece a alimentação como direito social fundamental, assim como saúde e educação. Além disso, o Estatuto do Idoso reforça a obrigação do Estado em garantir alimentação adequada à população idosa, um dos públicos prioritários do Bom Prato.
Portanto, não falta respaldo jurídico. O que falta é vontade política e um plano nacional estruturado que trate a fome não como problema de campanha, mas como política de Estado.
Se o Brasil decidisse criar uma rede nacional de restaurantes populares inspirada no modelo paulista, alguns pilares seriam indispensáveis:
Financiamento sólido e permanente
Subsídios federais garantiriam o preço simbólico, enquanto estados e municípios participariam da manutenção e expansão.
Gestão compartilhada com sociedade civil
Seguindo o modelo paulista, entidades filantrópicas, ONGs e Santas Casas poderiam administrar as unidades em parceria com o Estado, reduzindo burocracia e aumentando eficiência.
Escala nacional com logística regional
Cada região teria cardápios adaptados à sua cultura alimentar e logística própria de abastecimento, aproveitando a produção local e reduzindo desperdício.
Uma rede nacional de restaurantes populares traria efeitos que vão muito além da refeição barata:
Segurança alimentar para milhões de brasileiros em situação de vulnerabilidade.
Estímulo à agricultura familiar, ao priorizar alimentos produzidos localmente.
Redução do desperdício, com melhor aproveitamento da produção.
Inclusão social e dignidade, especialmente para idosos, desempregados e moradores de rua.
O argumento de que "é caro manter" não se sustenta diante do custo social da fome. O Brasil perde muito mais em saúde pública, produtividade e desigualdade do que investiria em um programa nacional inspirado no Bom Prato.
Em outras palavras, cada R$ 1,00 subsidiado representa economia em saúde, aumento de dignidade e fortalecimento da cidadania.
O Bom Prato é a prova viva de que alimentação popular é possível quando há continuidade política, compromisso e boa gestão. O próximo passo deveria ser transformar a exceção paulista em uma regra nacional.
O Brasil precisa de um Plano Nacional de Restaurantes Populares, que una governos, sociedade civil e produtores locais. Afinal, um país que alimenta o mundo não pode aceitar que seu próprio povo vá dormir com fome.
Convite para o próximo artigo exclusivo da TVSaude.Org:
No próximo artigo, vamos investigar como a agricultura familiar pode ser o alicerce para sustentar uma rede nacional de restaurantes populares, gerando emprego, reduzindo desperdício e garantindo comida no prato de milhões de brasileiros.