Cuidar de alguém com esclerose múltipla é um gesto de amor — mas exige equilíbrio, escuta ativa e a consciência de que o paciente continua sendo protagonista da própria vida.
Conviver com uma doença crônica como a esclerose múltipla (EM) é um desafio diário para quem recebe o diagnóstico — mas também para os que convivem com essa pessoa. Familiares e cuidadores são figuras centrais no processo de enfrentamento da doença. No entanto, nem sempre sabem como ajudar sem ultrapassar limites emocionais, físicos ou psicológicos.
O paciente precisa de apoio — não de tutela
A primeira armadilha para a família é o excesso de zelo. Muitas vezes, por medo ou compaixão, familiares começam a tomar decisões no lugar do paciente: o que ele deve comer, quando deve descansar, se pode ou não sair de casa.
Essa postura, ainda que bem-intencionada, pode infantilizar o paciente e comprometer sua autoestima. Como ressaltam especialistas, o papel da família é dar suporte, e não controle.
Escutar é mais importante que sugerir
Ao conversar com alguém com EM, evite conselhos prontos, frases motivacionais vazias ou fórmulas mágicas. Em vez disso, pratique a escuta ativa. Pergunte:
"Como você está se sentindo hoje?"
"Quer que eu te acompanhe ou prefere ir sozinho(a)?"
"Tem algo que eu possa fazer para te ajudar agora?"
Essas perguntas dão ao paciente o poder da escolha, e isso é vital para manter sua autonomia.
Respeite os dias bons e ruins
A esclerose múltipla tem natureza imprevisível. O paciente pode estar bem hoje e, amanhã, acordar com fadiga severa ou dormência. É importante que familiares entendam que isso não é preguiça ou falta de vontade — é o corpo sob ataque do próprio sistema imunológico.
Evite cobranças como “mas ontem você andou tão bem” ou “você está exagerando”. A aceitação das flutuações é parte do cuidado genuíno.
Cuidar do cuidador também é parte do processo
Cuidar exige energia física, emocional e psicológica. Por isso, o cuidador também precisa de apoio. Grupos de escuta, psicoterapia e tempo pessoal devem fazer parte da rotina de quem se dedica a acompanhar um ente querido com EM.
O esgotamento do cuidador pode se refletir em impaciência, culpa ou até em falhas no cuidado — por isso, cuidar de si mesmo é essencial para cuidar do outro.
Participar, sem invadir
A melhor forma de ajudar é estar presente nos momentos críticos — como hospitalizações, surtos, consultas médicas — e também nos cotidianos: compras, transporte, atividades simples.
No entanto, o paciente deve ser incentivado a fazer o que pode sozinho, ainda que de forma diferente ou adaptada. Cada pequeno gesto de independência reforça sua autoestima e sensação de controle sobre a vida.
A comunicação é o alicerce
Uma casa com paciente crônico precisa ser, antes de tudo, um ambiente de diálogo sincero, sem tabus. Falar sobre medo, dor, planos, expectativas e frustrações faz parte do processo de reconstrução.
Não se trata de fingir que está tudo bem o tempo todo — mas de construir juntos um caminho possível e real.
Convite para o próximo artigo
No próximo artigo da série, vamos discutir os direitos legais das pessoas com esclerose múltipla: acesso ao tratamento, aposentadoria por invalidez, isenção de impostos e muito mais — o que a lei garante, mas pouca gente conhece.