Um comportamento muitas vezes ignorado ou banalizado pode ser a ponta do iceberg de distúrbios emocionais, compulsões e impactos graves à saúde física e mental.
Durante uma visita recente a um hospital, uma enfermeira compartilhou um relato pessoal que chamou atenção pela sinceridade e pela dor escondida nas entrelinhas. Por muitos anos, ela roía as unhas até fazê-las sangrar. “Era mais forte do que eu”, desabafou. O hábito, aparentemente comum e até culturalmente tolerado, é conhecido como onicofagia, e pode revelar muito mais do que uma simples ansiedade passageira.
A onicofagia é o ato compulsivo de roer as unhas, classificado por especialistas como um transtorno do controle do impulso. Está presente tanto em crianças quanto em adultos e, embora muitos comecem na infância, o comportamento pode persistir por décadas se não for tratado adequadamente.
Roer unhas é, para muitos, uma válvula de escape para emoções mal processadas. Ansiedade, estresse crônico, traumas e até depressão podem estar por trás do comportamento. Em alguns casos, é um dos sintomas do Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC), exigindo atenção especializada.
O cérebro busca alívio imediato para a tensão interna — e o ato de roer, mesmo que cause dor, gera uma sensação de conforto momentâneo. O problema é que a prática se repete e não resolve a origem emocional do sofrimento.
Os prejuízos causados pela onicofagia não se restringem à aparência das mãos. O contato constante com a boca pode causar:
Infecções bacterianas e fúngicas nas unhas e na região periungueal
Danos permanentes ao formato das unhas, que podem crescer tortas ou deformadas
Machucados e sangramentos constantes, facilitando a entrada de agentes infecciosos
Problemas dentários, como desgastes e desalinhamentos
Baixa autoestima e vergonha de exibir as mãos
Em casos graves, como o relatado pela enfermeira, a onicofagia pode exigir tratamento multidisciplinar, envolvendo psicólogos, psiquiatras e dermatologistas.
Sim. A primeira etapa é reconhecer que o hábito não é inofensivo. A partir daí, várias abordagens são possíveis:
Psicoterapia: especialmente com foco em ansiedade, TOC e regulação emocional
Técnicas de substituição de comportamento, como uso de bolas de antistresse ou elásticos no pulso
Aplicação de esmaltes com gosto amargo, como recurso aversivo
Tratamento medicamentoso, nos casos mais severos, sempre com prescrição médica
Além disso, grupos de apoio e terapias alternativas como mindfulness, meditação e acupuntura também podem ajudar a reduzir os gatilhos emocionais.
Relatos como o da enfermeira são um convite à empatia. Muitas vezes, as pessoas que roem as unhas são vítimas de julgamentos e piadas, quando o correto seria oferecer apoio e incentivo à busca por ajuda.
Tratar a onicofagia como um sintoma — e não como um defeito — é o primeiro passo para quebrar o ciclo da compulsão e da dor escondida.
No próximo artigo, vamos explorar outro hábito silencioso que pode afetar gravemente a saúde: a tricotilomania, o ato compulsivo de arrancar os próprios cabelos — uma compulsão que, assim como roer unhas, clama por acolhimento e tratamento.