A pejotização se tornou uma epidemia silenciosa nos hospitais, transformando profissionais essenciais em prestadores desprotegidos e fragilizando o próprio sistema de saúde.
Nos últimos anos, o setor da saúde passou a conviver com uma prática que ameaça não apenas os direitos trabalhistas, mas também a própria qualidade do atendimento médico: a pejotização.
Sob o argumento de “modernizar” as relações de trabalho, hospitais públicos e privados têm contratado médicos, enfermeiros e outros profissionais como pessoas jurídicas, evitando encargos e obrigações previstas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Na aparência, trata-se de uma relação entre empresas. Mas, na realidade, esses profissionais continuam submetidos a rotinas fixas, plantões obrigatórios, ordens hierárquicas e pagamento regular por horas trabalhadas — características típicas do vínculo de emprego formal.
“Quando o trabalhador aceita ser contratado por essa via, ele é induzido a abrir mão de direitos irrenunciáveis, como décimo terceiro salário, férias acrescidas do 1/3 constitucional, FGTS e seguro-desemprego”, destacou um representante do Ministério Público do Trabalho (MPT).
A pejotização no setor da saúde cria uma distorção perigosa: quem dedica a vida a cuidar dos outros passa a trabalhar sem as garantias mínimas para cuidar de si mesmo.
Essa lógica, além de injusta, contribui para o adoecimento físico e emocional de profissionais que já vivem sob alta pressão. Sem férias remuneradas, sem estabilidade e sem segurança previdenciária, muitos enfrentam jornadas extenuantes e um cotidiano de insegurança.
A pejotização viola dispositivos expressos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e princípios constitucionais de proteção ao trabalhador.
O artigo 3º da CLT define como empregado “toda pessoa física que presta serviços de natureza não eventual, sob dependência e mediante salário”, o que se aplica claramente aos profissionais de saúde quando há subordinação e habitualidade.
O artigo 9º da CLT declara nulos os atos que visem fraudar ou impedir a aplicação da legislação trabalhista — exatamente o que ocorre quando hospitais disfarçam relações de emprego sob contratos empresariais.
Já a Constituição Federal, no artigo 7º, estabelece direitos sociais mínimos e irrenunciáveis, como férias, 13º salário, FGTS e licença remunerada.
Com base nesses fundamentos, decisões do Tribunal Superior do Trabalho (TST) têm reconhecido o vínculo empregatício mesmo quando a contratação se dá via pessoa jurídica. O Ministério Público do Trabalho (MPT), por sua vez, considera a pejotização uma fraude coletiva que atinge o erário, desequilibra o mercado e precariza o atendimento à população.
Art. 3º da CLT: Define o vínculo empregatício e seus requisitos.
Art. 9º da CLT: Torna nulos contratos com objetivo de fraude trabalhista.
Art. 7º da Constituição: Garante direitos sociais mínimos aos trabalhadores.
TST: Jurisprudência reconhece vínculo mesmo em contratos de PJ.
MPT: Trata a pejotização na saúde como fraude e irregularidade coletiva.
A pejotização na saúde é mais do que uma questão legal — é uma questão ética.
O profissional que dedica a vida ao cuidado humano merece proteção social, estabilidade e dignidade, não contratos precários que o tornam refém de um sistema que ignora o valor do seu trabalho.
Não se trata de burocracia, mas de justiça social e sustentabilidade humana. Um médico exausto, sem férias, sem respaldo trabalhista e sem segurança financeira, não é apenas uma vítima: é um sintoma de um sistema doente.
Defendemos que a valorização da saúde pública e privada começa com o respeito aos profissionais que a sustentam. Nenhum modelo de gestão pode ser considerado moderno se transforma pessoas em números e vidas em custos.
Combater a pejotização é reafirmar que cuidar da saúde começa por garantir dignidade a quem cuida.